Home Office Um Ano Depois

 em Área Humana Educação Superior, Educação superior, Texto Área Humana Educação Superior
 

Marco Ornellas

Marco Ornellas
Consultor em Desenvolvimento Organizacional l Coach l Escola de Recursos Humanos l Palestrante,
Estamos em março de 2021, a pandemia ainda é uma realidade e continua imprevisível. Um ano depois, estamos em seu pior momento, registrando mais de três mil mortes em 24 horas, com um média móvel assustadora. Nossas certezas vão ficando para trás à medida que um novo cenário se descortina à nossa frente.

Já pensamos que em 90 dias tudo isso ia passar e voltar ao normal. Já acreditamos que no final de 2020 tudo estaria resolvido. Já acreditamos que até maio de 2021 todos estaríamos vacinados. E assim, nossas certezas foram desmoronando, como um castelo de areia com a chegada do mar.

Nessa situação, o home office compulsório que se instalou na maior parte das empresas também completa um ano. Passado esse tempo, já é possível fazer uma análise com mais dados, aprender e ao mesmo tempo imaginar algumas tendências e mudanças no modelo de trabalho no futuro.

Como base para esse artigo, fizemos uma enquete rápida nas nossas redes e grupos e o que vamos discutir são respostas e questões relativas a esse período e o futuro para 64 respondentes. Os números dão um pequeno panorama do que tem sido o home office para essas pessoas, de diferentes empresas e posições.

Na ótica das lideranças, passada a insegurança inicial com o desempenho e as entregas, parece haver um entendimento de que a produtividade média subiu. Ainda há um caminho de aprendizado a ser percorrido, para que se possa lidar com equipes em teletrabalho, adequando-se as formas de interação e as cobranças, mas no geral parece que esse ajuste vem sendo alcançado.

Nessa mesma direção, essa semana mesmo tivemos o exemplo do Banco Citi, na pessoa da CEO do Citigroup, Jane Fraser, ao identificar questões de bem-estar entre os funcionários em home office, proibindo as videochamadas às sextas-feiras, criando o Zoom-Free Fridays, e incentivando todos a tirarem férias.

Com atitudes como essa, os efeitos negativos que muitos experimentam ao trabalhar em casa serão atenuados, o que se refletirá em aumento de produtividade ainda maior. Isso deve levar à decisão, para muitas empresas, de adotar o modelo de forma permanente ou mesmo híbrida, o que mostra que não haverá volta para aquilo que um dia já se chamou de “normal”, lá no longínquo ano de 2019.

A Ford, por exemplo, vai manter 30.000 funcionários em teletrabalho, mesmo depois que terminar a pandemia. Os efeitos disso no mercado imobiliário são cada vez mais sentidos, com planos sendo desenvolvidos para a reversão de salas de escritórios em unidades habitacionais, sob o risco de edifícios inteiros ficarem vazios, levando a acontecer o mesmo com ruas e avenidas que, hoje, abrigam prédios comerciais. Outras empresas já estão transformando os escritórios e salas em espaços de colaboração. Outras ainda, em laboratórios de inovação e trocas.

Do ponto de vista dos funcionários, os dados que vêm aparecendo são muito interessantes. Dos entrevistados, 71,88% estão apenas em home office e 23,44% em formato híbrido, com apenas 4,69% trabalhando no formato presencial e nos antigos escritórios.

Outro ponto de destaque e objetivo principal dessa enquete e artigo: 76,56% acreditam estar trabalhando mais agora do que antes da pandemia. A fantasia de que o home office tinha diminuído a produtividade ou o volume de trabalho, parece ter ido por terra. Sim, estamos trabalhando mais do que antes.

Alguns motivos foram apontados para isso, desde o fato de que o tempo de deslocamento foi convertido em tempo de trabalho, até o aumento no número de reuniões. Segundo um dos entrevistados “até para trocar duas palavras, aquele tapinha nas costas virou mais uma reunião”. Outros, apontaram que trabalharam mais nos 9 primeiros meses e agora conseguiram se reorganizar e já trabalham até menos, com melhores resultados.

Perguntados se mantinham as mesmas atividades de antes da pandemia, 31,25% disseram que sim, 54,69% apontaram que outras atividades foram incorporadas e somente 14,06% relataram que algumas foram abandonadas. Olha que incrível: a lógica do trabalho feito fisicamente e presencialmente foi simplesmente transferida para o teletrabalho, para o trabalho virtual, sem nenhuma adaptação ou revisão.

Deixamos de considerar inúmeras variáveis importantes: conteúdo do trabalho, a tecnologia necessária para realizar as referidas atividades, o processo de aprendizagem e tempo inclusos, e simplesmente transferimos para o mundo do teletrabalho o que fazíamos presencialmente.

Sobre a perspectiva de mudança das atividades no futuro, seja em termos de processos ou de tecnologia, tivemos 65,63% afirmando que sim e 34,38% que não. Aqui fica nossa dica, é importante revisar o conjunto de atividades, o que tem valor, o que não tem e como conduzir essas atividades em um novo formato.

Outra resposta perturbadora: quando perguntados se viam as atividades que desempenhavam hoje como ainda relevantes em 10 anos, a maioria, 81,25%, respondeu que sim. Sobre essa visão, já abordamos o assunto em outro artigo e essas respostas mostram que é interessante voltar a ele, uma vez que muitos cargos hoje existentes serão substituídos por Inteligência Artificial, estejam os trabalhadores em home office ou não. Difícil acreditar que muitas atividades permanecerão vivas e realizadas da mesma maneira em 10 anos. Não!

Ainda sobre o futuro, quando perguntados se ao fim da pandemia acreditavam que voltariam ao trabalho presencial em escritórios, 84,38% acreditam que trabalharão de maneira híbrida. Esse percentual e dados de várias pesquisas demonstram que essa é uma das certezas que temos hoje, de que a forma de trabalho mudou. Perguntados também se apoiariam a adoção definitiva do modelo, apenas 21,88% responderam que não, com os outros entrevistados se dividindo entre o home office e o modelo híbrido. E aqui, temos alguns comentários:

Acho que o sistema híbrido preenche melhor as necessidades, pois proporciona os benefícios dos dois sistemas para ambos os lados, empresa e funcionário, como socialização, vínculo cultural, flexibilidade, jornadas de trabalho mais equilibrada.”

“Com opção de híbrido, o home office tem muitas vantagens e, dentre elas, a possibilidade de contarmos com profissionais sem a preocupação de distância. Estão todos a um clique.”

“Quanto à gestão, creio que esse mesmo avanço tecnológico vai trazer novas oportunidade, entre eles nossa conexão com o senso de humanidade, inclusive uma remodelação do papel do gestor como principal função: perceber as emoções da equipe, como um catalisador – expansor – calibrador, exigindo mais habilidades emocionais e intuitivas no futuro do que neste presente.”

Passados um ano dessa experiência, já devíamos estar mais maduros nesse novo formato de trabalho, com resultados mais significativos, se é que de fato acreditamos que essa será uma tendência futura. No entanto, pouca coisa mudou no conjunto das atividades e mesmo nas relações com os líderes. Para 50% dos respondentes a relação com os superiores permanece igual, 32,81% disseram estar melhor e somente 07,19% apontaram uma piora da relação.

Como em outras pesquisas, temos dados com óticas opostas. Alguns números mostram uma mudança, mas ao mesmo tempo denunciam a inércia da verdadeira transformação, como se estivéssemos aguardando tudo isso passar e voltar ao normal. Já os dados animadores, revelam a consciência de que estamos diante de um novo modelo de trabalho, que deverá se popularizar na forma híbrida em alguns casos, enquanto outros deverão adotar o modelo exclusivamente de trabalho à distância.

Como exemplo, a consultoria McKinsey, citada pela Folha de São Paulo, chegou a conclusão de que “um modelo híbrido, com trabalho remoto de três a cinco dias por semana, poderia ser feito com a mesma eficácia de quem está permanentemente no escritório para mais de 20% da força de trabalho. Com a vantagem de ser bem mais barato para a empresa.”

A economia realmente se destaca nessa equação. O caso da XP, que mantinha seis andares de um edifício na área expandida do centro financeiro de São Paulo, é um exemplo. Anunciaram home office permanente e a construção de uma sede em São Roque, a Villa XP, um edifício sustentável que contará com café, palco de eventos e salas de treinamentos, além de um complexo esportivo e área para crianças. Para os trabalhadores em casa, será enviado um kit com notebook, monitores adicionais, mouse, teclado, fones sem fio e com cancelamento de ruído.

As vantagens desse modelo são inúmeras, em especial no equilíbrio e harmonia da força de trabalho e a quebra da geografia. E até da nacionalidade, à medida que passo a olhar o mercado de trabalho como global e não mais local. As dificuldades de contratar alguns tipos de profissionais podem ser minimizadas, quando se amplia o meu campo de pesquisa e busca. Você já pensou nisso?

É um novo tempo que já chegou.

Provavelmente, chegaria de qualquer forma, mas foi acelerado por um evento para o qual o mundo corporativo não tinha se preparado. O home office foi uma das ferramentas utilizadas e cada vez mais, dá mostras de que veio para ficar.

Vamos ver no próximo ano, o que mudou e o que ainda mantemos do status quo.

Postagens Recentes

Comece a digitar e pressione Enter para pesquisar